terça-feira, 24 de novembro de 2020

Eu e o Théo




Nasceu no começo de 2019 - estima-se que no dia 8 janeiro. No penúltimo dia de março tornou-se o mais novo integrante da nossa família, por isso, decidimos adoptar o dia 30 de março para data comemorativa. Sugerimos todos os nomes possíveis e imagináveis. Mas era Theo que o Mateus queria. E Theo ficou.
No dia da adopção, parecia um anjinho. Estava lá num cantinho, sossegado. Fofo, fofo, fofo. "Podemos ver aquele?" Puseram-no no colo do meu marido e logo adormeceu. Depois ficou tranquilo no colo do Mateus. Os três olhávamos para ele enternecidos. Como resistir a tamanha fofurice? Ele dormia pacifica e tranquilamente como se o nosso colo fosse o seu lar. Logo percebemos que o Mateus já tinha feito a sua escolha. (E o Théo, aparentemente, também.) Quando o deitámos na cama na loja de animais, para testar se o tamanho era adequado, adormeceu, mais uma vez, ali mesmo - e compramos esse modelo de cama. Irresistível. Parecia um bichinho de peluche. Acho que foi o único dia da vida dele em que parecia ser um anjinho - vá, justiça seja feita, quando dorme ainda parece um anjinho. Mesmo depois de chegar à sua nova casa, continuou tranquilo, dorminhoco. Um doce.
Nas primeiras noites, tinha dificuldades para dormir a noite inteira e acordava muito, muito cedo. Realmente tínhamos, novamente, um bebé em casa, que não nos deixava dormir tanto quanto gostaríamos. Chegou pequenino. Tão pequeno que, durante o dia, adorava dormir escondido em baixo dos armários da cozinha. Insistiu em dormir lá até ficar entalado, alguns meses depois, e precisar de ajuda para sair por algumas vezes. Resignou-se à sua nova condição: passou a dormir ao lado do armário, só com a cabeça escondida em baixo dele. (Agora nem a cabeça dele cabe lá.) À noite, dormia num cantinho entre a nossa cama e a parede, com a cabeça igualmente enfiada em baixo da cama. Ainda hoje é um dos lugares preferidos dele para dormir, embora já não consiga enfiar a cabeça em baixo da cama - mas ainda consegue dormir em baixo da poltrona da sala, que ele usa como sua cabana.
A cama dele foi uma das primeiras vítimas: em poucos dias já tinha estragado o fecho e roído um dos cantos. Seguiram-se os pés das cadeiras da sala. Quando o deixámos sozinho em casa, arrancou pedaços de espuma de uma almofada. Em outra ocasião, cantos de lençóis e edredons - um dos lençóis ficou em frangalhos.
Sempre gostou de mordiscar e pular. O alvo predileto é, e sempre foi, o Mateus. Os dois fazem a festa, mas quase sempre acaba com reclamações das mordidas e arranhões.
É medroso. Gosta de passear, mas adora voltar para casa e, quando somos nós a sair, recebe-nos entusiasticamente, com pulos e mais pulos, como se não nos visse há meses!
Acho que o que mais gosta na vida é de comer. Claro que não a própria ração. Basta ouvir-nos na cozinha a mexer em alguma embalagem ou talheres e corre para lá para ver se vai ter sorte, e se nos vê a comer alguma coisa, senta-se, educada e pacientemente à nossa frente, implorando com o olhar - sim, aquele olhar tipo "Gato das Botas" - que partilhemos com ele . Qualquer coisa. Alguma coisa. Adora fruta, bolacha e macarrão cru - fica sorrateiramente à espreita todas as vezes que vamos colocar macarrão na panela, não vá algum pedacinho cair...- E cai mesmo, acho que de tanto que ele torce para que aconteça.
Apaixonei-me por ele logo no primeiro dia e ele, bebezinho, talvez sentindo o meu carinho por ele, seguia-me por todo o lado. Não podia nem ir à casa-de-banho que lá ficava ele a choramingar na porta. Hoje em dia, ainda me segue se vou estudar piano, por exemplo, e fica a chorar na porta se não o deixo entrar. À noite, quando percebe a nossa movimentação na sala e os diálogos, corre imediatamente para a porta do quarto do Mateus, e fica sentado a olhar para ela: já sabe que é hora de ir dormir e quer entrar para dar boa noite. Abrimos a porta do quarto, ele dispara para cima da cama e deita-se lá à nossa espera. Algumas vezes fica perto de nós enquanto lemos um pouco. Depois, o Mateus faz carinho nele, dá beijo de boa noite e ele volta para a sala. Connosco também tem sempre o mesmo ritual: espera que me deite e, só então, sobe também na cama e deita-se no meu lado esquerdo (em que a cama está encostada à parede) com o focinho em cima da minha barriga. Se, por acaso, não vai diretamente para o lado esquerdo, dizemos "Théo: lá no teu lugar" e ele, imediatamente, vai para lá. De manhã, se sente que o Sérgio se mexeu na cama e vai acordar, logo se levanta e abana o rabo como um tambor rápido e ritmado. Também adora deitar-se aninhado nas pernas do pai . Quando ouve o Mateus no quarto dele, sai em disparada para a porta para lhe dar bom dia. Adora brincar conosco no quintal com a bola dele - que, diga-se, já tem tantas partes mordiscadas que, tecnicamente, já não é exatamente uma bola - e, principalmente, com a nossa bola de futebol - que, definitivamente, já não é uma bola - que abocanha enquanto abana a cabeça vigorosamente de um lado para o outro - qual predador que exibe a sua presa nos dentes.
Quando ouve a campainha, ladra sem parar. Quando ouve as pessoas a falar na rua também. Sempre ladrou para a televisão desligada, pois vê nela o próprio reflexo. Não pode ver um papel ou guardanapo perdido por aí que logo os come como se se tratasse de um petisco saboroso. Não gosta de tomar banho e, principalmente, não gosta do secador. Também não gosta de ter o pêlo escovado - tenta, insistentemente, morder a escova, o que dificulta a nossa tarefa de o escovar.
É muito querido, companheiro e beijoqueiro. Mas não gosta de abraços nem apertões. Também não gosta que o Mateus se meta com ele quando está entretido a roer o seu osso. 
Sabe que o amamos. Sim, não tenho pudor de o dizer: amo o meu cão, nessa forma de amor única que existe entre nós, seres humanos, e eles, bichos de estimação (principalmente cães) que nos amam incondicionalmente e nos ensinam tanto sobre isso e também sobre a felicidade dos pequenos momentos partilhados. E se há coisa que eu gosto aqui no Brasil é que aqui eu não sou dona do Théo: aqui sou a mãe dele.