quinta-feira, 22 de dezembro de 2016

Eu, a senhora no elevador e a moça com o sorvete

Há uns tempos atrás, estava eu no elevador de um shopping, e entra uma senhora alta, vistosa, elegante. Noutro andar, entram várias pessoas, entre elas, uma moça que estava a comer um McFlurry - sorvete do McDonald´s. Eu estava bem perto de ambas. A senhora alta e elegante, olhava, olhava e olhava para o sorvete da outra moça, imagino que com água na boca. A certa altura, não resiste e diz, referindo-se ao sorvete: "Que cara ótima! Me desculpe, mas... o que é isso que você está comendo?" "É o novo sorvete com Ovomaltine do McDonald´s", responde a moça. "Ah...", continua a senhora. Pausa de alguns segundos. "Mas e essas bolinhas aí?" "Não sei bem explicar...é chocolate. São bolinhas de chocolate...", explicou a moça que, simpaticamente ofereceu "A senhora quer experimentar?" A senhora, um pouco envergonhada e rindo bastante - tal como outros de nós ali no elevador sorrimos- agradeceu "Não, não, obrigada!.. É que a cara desse sorvete está ótima mesmo, foi curiosidade. Me desculpe a indiscrição." A moça sai do elevador junto com a maioria das pessoas. Eu e a senhora alta continuamos. As duas sorrimos. Ela olha para mim e diz "Não resisti. Meu Deus, que cara ótima! Não é?" Sorrio e concordo com ela.. Antes de sair do elevador, conclui sabiamente "Ai, minha filha, nós mulheres, nos dias de hoje, é assim mesmo: ou a gente veste o que a gente quer, ou a gente come o que a gente quer!" - diga-se que, nestes anos a viver no Brasil, foi das melhores coisas que já ouvi! A julgar pela elegância dela, acredito que ela tenha optado pela primeira. Já eu...vou-me equilibrando entre as duas. Como se diz no meu país: nem tanto ao mar, nem tanto à terra. Fico feliz quando perco um quilinho, mas também fico feliz quando como um belo sorvete!

segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

Eu e a sala São Paulo




Frequentei, com regularidade, durante alguns anos, a sala de concertos da Gulbenkian em Lisboa. Depois de anos aqui em São Paulo fui, finalmente, à Sala São Paulo há uns meses atrás. Arquitetura lindíssima. Impressiona já no exterior e, entrando na sala de concertos, é mais bonita ainda: uma harmoniosa mistura entre elementos modernos e elementos clássicos. Acústica privilegiada, orquestra (OSESP) muito, muito competente. Embora não traga tantos solistas renomados quanto podíamos ver na Gulbenkian, tem um programa bastante eclético e valoriza bastante a música contemporânea.
Ali, à espera de entrar na sala, senti-me na Gulbenkian outra vez. Muitas senhoras de mais idade, com os melhores vestidos e jóias para ir ouvir o concerto, senhores bem vestidos também, e muitos jovens, ora com calças jeans rasgadas e camisetas do Che Guevara, ora de calças sociais e camisa. Com certeza, grande parte daquelas senhoras, senhores e jovens, devem cruzar-se naqueles corredores e cadeiras quase todas as semanas. Já conhecem os rostos uns dos outros. Já conhecem os funcionários da bilheteria, pedem sempre o mesmo bolo ou salgado a acompanhar o café ou o chá, e seguem o mesmo ritual ao entrar na sala de concertos. Como acontece na Gulbenkian, talvez alguns deles apreciem mais o passeio e o encontro (quase) semanal com os amigos ali do que o próprio concerto em si. Comentam sobre os amigos em comum, sobre a família ou sobre os acontecimentos noticiados na semana. Chegada a hora de entrar para o concerto, despedem-se "até já, até já" e, no intervalo, em novo encontro, comentam sobre a primeira parte do concerto. Outros tantos, jovens, vão ali no intervalo do seu próprio estudo de música: vivem e respiram cada nota, emocionam-se, inspiram-se para continuar a melhorar, para não desistir. Prestam atenção a cada detalhe. Além de aproveitar o concerto, fazem dele uma aula. Sonham. Quando o concerto acaba, suspiram enquanto pensam "é isto que quero para a minha vida!"
Acústicas e arquiteturas à parte, de uma coisa sei: em todas as salas de concerto sentimos a mesma energia pulsante enquanto a música encobre o silêncio de cada pessoa ali sentada. O próprio silêncio é mais bonito numa sala de concertos. Ele é audível, perceptível: por instantes, podemos sentir que ele existe realmente. E a música...ah, a música, seja lá em que país for, é uma das coisas mais especiais e emocionantes com que a vida nos presenteou. Une, centenas de pessoas, na mesma energia, vibra, na sua forma particular, em cada um presente ali e faz-nos, inexplicavelmente, partilhar, por momentos, a nossa humanidade de uma forma única.
Obrigada, OSESP e sala São Paulo, pelos lindos momentos que me proporcionaram.
Estarei aí no próximo ano, várias e várias vezes!

sábado, 10 de dezembro de 2016

Coisas que me fizeram parar

Avenida Paulista

Eu e a São Paulo menos óbvia




Já o devo ter dito aqui: o meu pássaro preferido em São Paulo é o sabiá. Não que, esteticamente, seja o mais bonito. O Bem-te-vi, por exemplo, é bem mais bonito: a cabeça branca e preta que parece exibir um penteado ousado, e o peito num amarelo vivo, alegre e chamativo. Já o seu canto...é, no mínimo, entediante. O sabiá, por outro lado, exibe cores mais discretas, mas um canto lindíssimo, ímpar. Apesar de já viver aqui há alguns anos, a melodia singela e harmoniosa do sabiá continua a surpreender-me. Dou por mim a parar em ruas típicas de São Paulo, cheias de prédios, só para ouvir esse canto inesperado e inesperadamente belo. Este é um dos lados menos óbvios de São Paulo que eu mais gosto: os sabiás e bem-te-vis que cantam nas ruas mais cosmopolitas e as orquídeas que teimam em renascer enroladas nas árvores da cidade.
Há umas semanas atrás, cheguei a casa de uns alunos meus e eles estavam animados com a visita de dois hóspedes: uma sabiá-mãe e um sabiá-bebé. A sabiá-mãe tentava incentivar o pequeno a voar. Ele ensaiava, mas não conseguia. Ficaram por ali um bom tempo: o bebé procurando a mãe, a mãe esvoaçando para lá e para cá, sempre perto do filhote. Até que, após muitas tentativas...lá foram. O sabiá-bebé abriu asas e voou para longe com a mãe. Embora um pouco tristes pela partida dos dois, todos comemorámos essa pequena grande vitória do bebé: abriu asas e foi conhecer o mundo! (Eu, pessoalmente, para além da conquista do pequeno, comemorei o facto de termos mais um sabiá para nos surpreender e encantar pelas ruas de São Paulo.)

quinta-feira, 24 de novembro de 2016

Coisas que me fizeram parar



A vista de São Paulo. Nem sempre o céu é o mais azul, nem sempre a vista é a mais ordenada mas, se olhar bem, há lugares que são impressionantes. Mesmo na sua desordem, no seu cimento a perder de vista, São Paulo tem a sua beleza particular. A questão é que nem todos e nem em todos os momentos estamos disponíveis para a perceber.

quinta-feira, 6 de outubro de 2016

quinta-feira, 4 de agosto de 2016

Eu e a Fada do Dente

Quando temos um filho, as coisas mais banais tornam-se extraordinárias. Ficar de gatas? Balbuciar sílabas? Dizer umas palavras? Dar uns passos?  Aprender a ler e escrever? Perder um dente de leite? Coisas triviais pelas quais todos passamos. E, ainda assim, que momentos especiais quando os vivemos enquanto mães/pais! Se há coisa que aprendemos com a maternidade é que cada momento é uma oportunidade: a coisa mais simples tem, em si, a semente da eternidade. A maternidade ensina-nos que não há nada mais importante que viver no momento presente, que aproveitar cada coisa do dia-a-dia. Através dos olhos de uma criança, tudo isso se torna evidente.
Ontem, o Mateus teve a visita da Fada do Dente pela primeira vez. Vi quando ela entrou sorrateiramente no quarto dele. Bem de leve, aproximou-se da cama dele. Observou-o a dormir, tranquilo. Muito cuidadosamente, levantou um pouco a almofada dele e procurou o dentinho de leite. Guardou-o numa caixinha, e deixou uma nota e uma moeda em troca. Sorriu e afastou-se. Esta manhã, o Mateus acordou-nos com um grito "Mããããe, paiiiiiiii, venham aqui!" Ai, Jesus, o que será que aconteceu? (De manhã cedo, o raciocínio é mais devagar...) Viu um bicho? Deixou escapar o xixi na cama? Quando chegamos ao pé dele tinha numa mão uma nota, na outra uma moeda, no rosto um sorrisão e nos olhos um brilho especial "Olha só o que a Fada dos Dentes me deixou!" "Que bom, filhote. Valeu a pena ter sido corajoso, não?" "Sim, eu já agradeci muito, muito à Fada!" "Parabéns, filho, temos de agradecer mesmo, todas as coisas boas que temos na vida."
No passado, um aluno meu disse-me muito triste e decepcionado "Joana, eu já sei que o Pai Natal não existe. São os nossos pais que nos compram os presentes de Natal." Disse-me isso com tristeza mas também lhe percebi uma esperança no olhar que eu fosse contrariá-lo, dizer-lhe que sim, que podia continuar a acreditar porque era verdade, sim! "Sabe", continuou ele "eu estou triste porque isso quer dizer que magia não existe. Não existem duendes nem Pai Natal, não existe magia..." "Não digas isso! Existe magia, sim. A vida está cheia de coisas mágicas!" "Ah, mas não é magia de verdade...", respondeu ele desapontado. "É, sim. É a magia das coisas que moram no nosso coração! Magia acontece, mesmo que não seja com pós de prilimpimpim. Só o facto de estarmos aqui, não é já magia? O amor não é magia?"
Eu sei que hoje de manhã houve magia aqui em casa.

domingo, 24 de julho de 2016

Eu e a alegria que contagia

Há pessoas que fazem o seu trabalho com alegria e isso faz toda a diferença. Como é desagradável depararmo-nos com aquelas pessoas que parece que nos estão a fazer um favor a servir o café ou a vender o jornal, não? Devo admitir que, embora também existam por aqui, se vêem mais desses por Lisboa do que aqui por São Paulo. Pelo contrário, como é de salutar as pessoas que fazem o seu trabalho com um sorriso, com gentileza.
Há uma cobradora de ônibus com quem me cruzo, de vez em quando, nos meus trajetos. Acho notável a forma como ela faz questão de cumprimentar todos os que ali entram. Cumprimenta, sorri, deseja boa viagem. Apanha muita gente de surpresa. Posso dizer, sem qualquer sombra de dúvida, que a atitude dela, influencia a atitude que recebe de volta: as pessoas também cumprimentam, também sorriem. Alegria gera alegria, gentileza gera gentileza. O ônibus em que aquela senhora trabalha é o mais cordial e mais sorridente de todos! Eu admiro-a. Assim como admiro o condutor de ônibus que se esforça por travar devagar, principalmente quando choveu e está tudo alagado e sabe que a travagem vai levantar um monte de água que vai molhar quem está à espera do transporte.
Há semanas atrás aconteceu um episódio que também reflete essa alegria no trabalho, seja ele qual for. Aqui em São Paulo, é comum algumas pessoas entrarem nos ônibus para tentar vender todo o tipo de coisas: chocolates, balas (rebuçados), carteiras, canetas, ou mesmo pedir uma simples esmola. Se em Lisboa era comum ouvirmos no metro "alguém tem a possibilidade de me ajudar?", aqui ouvimos o célebre "pessoal, boa tarde, desculpem estar incomodando a vossa viagem. O meu nome é tal e venho aqui pedir...(e contam parte da vida, do que os levou ali)." Há semanas atrás, entrou um desses senhores no ônibus. Tinha para vender carteiras para guardar documentos. Vendia uma por X e duas por Y. O ônibus estava relativamente vazio. Silêncio. Ouvia-se apenas a explicação do senhor. No final, novo silêncio. E um desabafo dele "puxa, essa crise está brava mesmo!.. Ninguém compra nada..." Abriu um sorriso e continuou "Ahhhh, mas eu sou brasileiro e não desisto nunca!" (frase célebre por aqui). "Vamos lá, pessoal, eu não saio daqui enquanto não vender uma...uma carteira!.."Entram mais algumas pessoas no ônibus. "Olha só uma moedinha aqui no chão." continuou ele. "Já sei, eu vou dar uma carteira a quem me der uma moeda de um centavo!* Vamos lá, mais barato que isto vocês não encontram!" As pessoas no ônibus começam a esboçar sorrisos. "Quem dá um centavo? Vamos lá, melhor que isto, só de graça, pessoal!" Mais sorrisos dos passageiros. A energia dentro daquele ônibus foi mudando...A alegria daquele senhor, as suas piadas, as tentativas de interagir com as pessoas, foram contagiando todos. O senhor parou próximo a mim. Disse-lhe: "parabéns pelo seu trabalho: você faz tudo com alegria e isso contagia as pessoas." "Ah, tem que levar com alegria mesmo, né?", respondeu-me. "Olhe, eu vou ajudar você e levar uma dessas para o meu filho. Ele adora guardar os papéis dele, os desenhos. Vou levar uma." o senhor anuncia "Olha aí a primeira, pessoal! Vendi a primeira!" Depois de mim, mais 3 ou 4 pessoas compraram. Mais gente entrou no ônibus, que ficou relativamente cheio. O senhor continuou a fazer piadas, comentários bem humorados referindo-se à crise política, à vergonha da corrupção generalizada, e toda a gente ria. No final, despediu-se "Pessoal, muito obrigado pela vossa atenção! Quem vai trabalhar: bom trabalho. Quem vai descansar: bom descanso. Quem vai estudar: estude muito, mas muuuuito mesmo, senão, um dia, vão estar que nem eu aqui, batendo canela! Estudar é tudo! Vão com Deus, pessoal!"
Saí daquele ônibus com dois reais a menos, mas com boa disposição redobrada!



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* Não existem moedas de 1 centavo.

Coisas que me fizeram parar

Esta excelente iniciativa...
Avenida Brasil

terça-feira, 3 de maio de 2016

Ainda a Rua Oscar Freire...












Mais um detalhe de uma loja na Rua Oscar Freire.
Adorável.


Coisas que me fizeram parar



Mais um dos bonitos contrastes de São Paulo: no meio de um bairro nobre repleto de enormes prédios, temos esta construção judaica.
Singela e sublime.

terça-feira, 22 de março de 2016

Eu e os acontecimentos das últimas semanas

Vivemos dias invulgares no Brasil. Sem entrar demasiado em todos os méritos da questão, quero apenas tocar em alguns pontos.
Todo o cidadão é considerado inocente até que se prove o contrário. Creio que ninguém põe essa máxima do estado democrático em questão. O que é questionável, parece-me, é que um cidadão sobre o qual pairam dúvidas, que está a ser investigado pelas entidades competentes para tal, que tem o seu nome envolvido em inúmeras situações dúbias, seja nomeado para um cargo público da maior importância. Será o momento mais adequado para tal? Normalmente, névoas deste género costumam gerar o efeito oposto...Não podemos também ignorar que, no caso, foi tudo feito com uma pressa inexplicável - tomada de posse antecipada em relação à data que se tinha estipulado primeiro, edição extra de diário oficial da união.

Por outro lado, acho louvável e admirável a forma como o povo brasileiro se tem manifestado nas ruas. De forma ordeira e pacífica exprimem a sua indignação e descontentamento. O que acho perigoso e lamentável é que no meio de toda esta situação, seja cada vez mais evidente o "nós e eles".  A coisa tem assumido uma tal proporção que nos vemos obrigados a pensar duas vezes na cor da nossa roupa antes de sair de casa, não vão uns pensar que estamos a defender os outros. O cerne da questão é esse mesmo: o Brasil não é de uns ou outros. O Brasil é de todos. O Brasil é para todos. Não se trata aqui de uma rivalidade de tipo futebolística. O governo brasileiro, seja ele qual ou quem for, serve o interesse do povo brasileiro. Enquanto essa for a motivação dos políticos no governo, está tudo certo. A partir do momento em que a motivação de quem governa é apenas manter-se a governar, alguma coisa de errado se passa. Peço desculpa se estiver errada, mas parece-me que nas últimas semanas a única coisa que o governo faz é tentar manter-se de pé. Pelo Brasil pouco ou nada tem sido feito. A senhora Dilma parece profundamente comprometida em ajudar os seus amigos, já que convida um para ser ministro e para o outro, que anteriormente ocupava esse cargo - mais uma vez, peço desculpa se estiver errada-, parece ter reconfigurado um novo cargo. Pergunto eu: não trará isso uma despesa ainda maior a um governo que se diz empenhado em cortar na despesa? Eu mesma valorizo muito as minhas amizades e há pessoas por quem me empenharia a fazer o qu e- atente-se na conjugação do verbo, sujeito a condição -  pudesse para ajudar. O que não podemos perder de vista é: a senhora Dilma e demais integrantes do governo ocupam cargos que os obrigam a dar total prioridade aos interesses e necessidades do povo brasileiro. É apenas a esse que devem urgência. Por isso, resta-nos torcer para que a justiça faça o seu trabalho, que as investigações se concluam o mais rápido possível e que, seja por qual caminho for, possamos seguir em frente, rumo a um Brasil melhor, mais maduro e mais justo. Não para eles ou para nós, mas para todos.

sábado, 5 de março de 2016

Coisas que me fizeram parar


Mais um detalhe delicioso da Rua Oscar Freire.

Para quem não conhece São Paulo, a Rua Oscar Freire é uma das ruas mais conhecidas da cidade. É uma rua comercial. É praticamente um shopping center a céu aberto. Ponto turístico. Quem por lá caminha, ouve todo o tipo de sotaques e de línguas pela rua, e vai ficar deslumbrado com a quantidade de lojas de marcas de luxo que por lá se encontra. De tudo um pouco. De livros, a malas, passando por roupa, canetas ou artigos de decoração. A mim, deslumbram-me particularmente detalhes como este, ou como o grafiti do post anterior, ou como outros que ainda vou retratar aqui. Simples, delicados, de uma beleza ímpar que nos faz sorrir à toa no meio da rua e...parar.
E é por estas e outras pequenas grandes coisas da vida que continuamos a caminhar.

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

Coisas que me fizeram parar



Rua Oscar Freire. Mais um belo grafiti de São Paulo. E este vem com brinde de umas árvores numa bela pracinha e, nesta tarde especificamente, ainda acompanhada por voz e violão de um músico que ali parou.
Assim é São Paulo: cheia de boas surpresas pelos seus caóticos caminhos.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

Eu e as surpresas

Dizem que o Pai Natal não existe. Que as fadas só vivem nas histórias de encantar. Que os super-heróis não passam de personagens dos livros de quadradinhos.
Dizem que o mundo está perdido, que já não há valores, ética ou moral. Que o ser humano é egoísta, que o mundo é cruel, que não se pode confiar em ninguém, que o consumismo rege a humanidade.
Pois eu digo que tenho visto por aí gente que dá, sem esperar nada em troca. Tenho visto gente que espalha alegria e magia pelo ar. Tenho visto gente que se supera e ajuda os outros a se superar. Tenho visto gente que se preocupa com os outros, que quer ajudar só porque sim, porque somos todos humanos e estamos aqui uns para os outros. Tenho visto gente que é gente.
E quantas surpresas boas essas pessoas são capazes de fazer!..Às vezes são coisas simples, muito simples como abrir a nossa caixa de e-mail e ter um e-mail de alguém que se lembrou de nós, que envia uma fotografia de alguma coisa que viu e achou que íamos gostar de ver - esta é especialmente para ti, V.: eu realmente adorei ver as fotografias das iluminações de Natal em Lisboa, principalmente porque elas te fizeram lembrar de mim e vi-as através do teu olhar. Outras vezes são meras palavras de carinho de quem se ama e que iluminam o nosso coração - um "te amo", "adoro-te", "tenho saudades tuas" fazem milagres na nossa energia interior. Outras vezes é dar o almoço a um mendigo ou umas bolachas a crianças de rua. Outras vezes é um presente que chega pelo correio, embrulhado em amizade e ternura. Outras vezes é doar o que uma família de refugiados mais precisa de receber ou o presente que uma criança orfã mais gostaria de receber no Natal. Podem também ser gestos - grandes, pequenos e médios- de quem nos ama e cuida de nós como de um pequeno tesouro - obrigada aos dois homens da minha vida. Outras vezes são gestos de carinho como viver longe do nosso país e nos oferecerem um doce da nossa terra porque sabem que é sempre bom sentir um gostinho de casa. Outras vezes é receber mais trabalho quando mais precisávamos porque algum conhecido recomendou. Outras vezes é uma ajuda, de qualquer tipo, no momento certo. Outras vezes é ajudar alguém em dificuldades a subir para o ônibus ou ceder o lugar sentado a quem mais precisa. Outras vezes é ver como alguém faz o seu trabalho com amor e dedicação e como isso influencia os outros de forma tão positiva, seja sendo cobrador no ônibus e esbanjando alegria e simpatia para todos os que ali passam, ou sendo professor e mudando de forma tão especial a vida de tantas crianças ou ainda sendo médico e fazendo milagres todos os dias. Alguns destes gestos deixam-nos totalmente sem palavras. E a mim, em particular, não raras vezes me levam às lágrimas. (Eu sou de choro fácil, bem sei. Não tenho vergonha de o admitir.) São gestos totalmente inesperados. Muitas vezes superam aquilo que de melhor podíamos esperar que acontecesse. A minha avó sempre disse: "pensa positivo, que boas energias atraem boas coisas". Às vezes, mesmo não pensando coisa nenhuma, a vida presenteia-nos. E eu só posso acreditar que alguma coisa de bom eu tenho feito por aqui - e quando digo "aqui" não quer dizer São Paulo, mas sim este universo onde recebemos a dádiva da vida. Este ano, por exemplo, o Pai Natal existiu de facto nas nossas vidas. Com um enorme sorriso no rosto disse-me: "vou dar isto ao seu filho." E eu, com lágrimas a lavar-me o rosto, não quis acreditar que o grande desejo do Mateus ia realizar-se. O desejo que nós andávamos a planear realizar no aniversário dele, com muitas contas de cabeça e algum sacrifício. E, de repente, ali estava ele, à minha frente. Agradeci, incrédula. Para eles - a "família Pai Natal"-  talvez não tenha sido nada de mais. Um presente. Um ato de desapego. Fazer um amigo feliz. Para nós foi muita coisa. Não só pelo presente em si, mas pelo gesto, pelo carinho, pela surpresa, pela felicidade do nosso filho - não há coisa que importe mais do que isso.
Dias depois, o Mateus também separou uns brinquedos para oferecer, como fazemos de tempos a tempos e, sem saber, acabamos por também realizar o maior desejo de um outro menino, o que me faz concordar em absoluto com as palavras de Oprah Winfrey:

"Dei a outra pessoa o mesmo que havia recebido. E, se existe algo que eu sei de verdade, é que é para isto que estamos aqui: para darmos continuidade ao ciclo de generosidade."
Pois façamos isso e, sem perder a fé uns nos outros, porque certamente quando damos o melhor de nós...