segunda-feira, 29 de julho de 2013

E lá vem...

...mais uma festa da Achiropita!

É já no dia 3 de Agosto que começa - e acontece em todos os finais de semana de Agosto.

Para quem aprecia uma boa fogazza e outras iguarias italianas. A criançada, além da boa comida, também gosta das barracas dos joguinhos- e, admita-se, alguns adultos também.

A não perder, na rua 13 de Maio, Bela Vista.

domingo, 28 de julho de 2013

Eu e o meu sotaque

É frequente abordarem-me na rua devido ao meu sotaque. À partida, até soa peculiar dizer "o meu sotaque", mas uma vez que aqui eu sou a minoria, a estrangeira, o sotaque é realmente meu. Muitas vezes é algum brasileiro descendente de portugueses que vem, alegre e orgulhosamente, naquela forma calorosa de ser dos brasileiros, revelar-me que, no fundo, no fundo, temos a mesma raíz: "você é portuguesa, não é?" "sim." "O meu pai/mãe/avó/avô também é/era!", dizem com um sorriso aberto. E acrescentam logo a cidade onde o parente nasceu. Confesso que, por vezes, não faço ideia de onde fica, mas sorrio sempre, acenando com a cabeça, e respondo que "sou de Lisboa". Às vezes eles também já lá estiveram e dizem "como é linda" e, outras vezes, revelam-me o quanto gostariam de lá ir. (Penso, secretamente: pois, eu também gostava.) A maior coincidência que já me aconteceu foi com um senhor que estava sentado ao nosso lado no autocarro. O Mateus e ele começaram a interagir e, quando ele me ouviu falar, afirmou "portuguesa." Quando lhe disse que era de Lisboa, respondeu-me "alfacinha". Percebi logo que, ou era português há muitos anos aqui, ou descendente de português. "Eu vivo aqui há mais de 30 anos, mas também sou português. De Lisboa.", disse ele. Conversa vai, conversa vem, percebemos que ele viveu décadas no mesmo bairro que eu, numa rua bem próxima da rua onde vivi mais de 15 anos com a minha mãe e irmão. Outras vezes, abordam-me com o já clássico para mim "você não é daqui..." A seguir ao meu "não..." já ouvi de tudo: há quem não se arrisque e se limite a perguntar "é de onde?", mas outros, perguntam com tom decidido, quase afirmando, as suas suspeitas, e já ouvi de tudo, desde "é portuguesa" a "italiana", passando por "espanhola" e, até mesmo, "é do sul".
No parque a que costumo ir com o Mateus é frequente ser questionada sobre o meu sotaque ou o meu pais. A cena mais caricata aconteceu quando uma menina me veio mostrar uma raíz de uma planta "olha: uma raíz!" Eu sorri e corroborei "é mesmo, você encontrou uma raíz". (Sim, eu modifico algumas estruturas frásicas e algumas expressões para que me entendam melhor, particularmente as crianças, mas mantenho o meu sotaque.) E ela, com um ar de quem sabe dos assuntos, corrige-me "não, é uma ráíz". E eu, primeiro sem entender, continuei "sim, uma râíz". "Não, não", diz-me ela com um ar de professora paciente, "rá-íz". Então percebi o equívoco, e antes que desse um nó na cabeça da menina, imitei o sotaque dela e, mais tranquila, lá seguiu ela para a brincadeira seguinte. A bem da verdade se diga que até o Mateus já me corrigiu uma ou duas vezes. Não lhe levo a mal, claro. Acho engraçado o igualmente ar sapiente dele a mostrar-me que conhece as palavras. E há, de facto, palavras que só agora está a ouvir pela primeira vez, e não é com o meu sotaque que as aprende. Seja como for, acaba por aprender com os dois, que só lhe faz bem ao ouvido, e diz "para mim é "báskéte", e para você é "básket".
Com os meus alunos tenho especial atenção. Entendem quase tudo o que digo. Quando surge alguma dúvida, é só escolher outra palavra ou expressão, ou atenuar o tal meu sotaque. Por exemplo, tenho muito cuidado a pronunciar a palavra "descer". Nós, portugueses, fazemos jus à expressão "a descer todo o santo ajuda" e deslizamos pela palavra com uma rapidez que, atropelando pelo caminho o "c" e o "s", acabamos por dizer "dexêr". Os brasileiros, pelo contrário, poupam nos "ss" e o descer deles soa a "dêcêr". Então, sempre que tenho de dizer essa palavra aos meus alunos - ou seja a quem for-, digo muito bem dito e com toda a calma o "des-cer". Com uma das minhas alunas tive uma agradável conversa sobre a diferença de sotaques a propósito da palavra "colcheia". Pediu-me para escrever a palavra. Depois, muito politicamente correta e amorosa, como sempre é, disse-me, como se alguém tivesse culpa no cartório, "é que, sabe, você fala como escreve, e nós mudamos algumas palavras...por exemplo, aqui está um "l", mas a gente fala como se estivesse um "u". Eu sorri. "Não há certo nem errado. Cada um tem a sua forma de dizer, o seu sotaque. Mas a gente se entende, não é?" Ela acenou sorrindo.
Quem mais me pergunta "você não é daqui" são os taxistas. Há tempos atrás, um deles disse-me "ah, de Portugal...E porque não deixou o sotaque lá?", brincou. "Bom, é o meu, só tenho este", respondi educadamente. "Mas assim está a mostrar que é portuguesa." "E...deveria esconder?", perguntei intrigada. "Não, não, claro que não...Não é isso..." disse ele meio atrapalhado. "O senhor me entende, não é?" "Sim, perfeitamente." "Então...por isso que não vejo necessidade de modificar o meu sotaque. Só preciso de ter cuidado com algumas coisas: falar devagar e com atenção às expressões que utilizo e, dessa forma, toda a gente me entende bem. Com o meu sotaque. Com ele cresci e, acredito, com ele irei morrer."




quarta-feira, 24 de julho de 2013

Eu e a feira - parte II

Sexta-feira de manhã o nosso programa é sempre o mesmo: feira. Há algumas semanas, estávamos nós a escolher a fruta da semana, quando vemos um senhor a andar esbaforido rua abaixo. Ia gritando aos quatro ventos "tá descendo, tá descendo!" Ainda estava eu a absorver o que quereria dizer aquela afirmação, quando vejo os senhores de uma banca próxima embrulhar de forma rápida, eficaz e profissional tudo o que estava em cima da mesa com o próprio lençol que servia de base. Em 5 segundos fizeram a trouxa, mais 5 segundos para tirar as madeiras que serviam de tampo de mesa, et voilà: sobrou um amontoado de caixas vazias, com ar de abandonadas e inutilizadas. Não sei precisar quantos segundos depois, vejo um grupo de polícias e funcionários da prefeitura a passar. Iam caminhando e observando todas as bancas.
Eram eles que, calma e atentamente estavam "descendo". Os outros, o mais rápido que puderam...subiram.

segunda-feira, 22 de julho de 2013

Nós e o Jardim Zoológico






Um dia de inverno que mais parecia verão. O Jardim Zoológico de São Paulo repleto de crianças acompanhadas dos pais ou outros familiares, ou em excursões de escola. Já lá tínhamos levado o Mateus o ano passado. Nessa ocasião, as suas pernas não aguentaram tanto quanto ele gostaria. Desta vez, andou que nem gente grande! Só queria colo para conseguir ver melhor os bichos. Mal os via, elegia logo outro diferente para procurar, o que, diga-se, nem sempre é tarefa fácil. O Zoo não tem a melhor sinalização mas, como ali andamos todos ao mesmo, é comum os visitantes que se cruzam em sentidos opostos partilharem informação sobre o que está para aquele lado. Outra boa ajuda são os próprios funcionários do parque que, pelo menos connosco, foram solícitos. 
Os bichos preferidos do Mateus continuam a ser o elefante, a girafa e o macaco, mas quando lhe perguntamos de qual gostou mais, a sua resposta é imediata e inequívoca: "todos!" Eu acho que não poderia haver melhor resposta. O Zoo realmente faz a alegria da petizada. Fora uns choros ou outros, uma birra aqui e acolá, o que mais se vê é sorrisos, dedos entusiasticamente apontados aos bichos e frases que, entoadas num tom alegre, começam com "olha ali o..." No final do dia, o que mais se vê são pequenos corpos esgotados pelo cansaço de tanta animação num só dia. Ao Mateus, tudo lhe chamou a atenção, desde a ave mais pequena ao animal mais feroz, e até os caixotes do lixo fizeram parte da sua diversão- aliás, uma bela aquisição do parque. Tivemos a felicidade de ver o mais novo habitante do Zoo: uma girafa de duas semanas de vida e o casal leão e leoa. Levámos todo o tipo de arsenal alimentar para o pequeno, pois da experiência do ano passado, retivemos a falta de opção para fazer uma refeição e, pior ainda, o elevado custo da mesma.
O Zoo fica fora de mão para quem vive no centro de São Paulo, mas tem facilidade de transporte: metrô até perto e dá para comprar um bilhete de entrada para o Zoo na própria estação que inclui um transporte numa mini-van da estação de metrô até ao Zoo - deixa-nos já dentro do parque- e que nos leva de volta à estação. 
Um ótimo programa para se fazer em família, especialmente para quem tem crianças pequenas. Foi um dia cansativo, mas profundamente recompensante: o Mateus adorou! E nós também. 

sexta-feira, 19 de julho de 2013

Nós e as contações de histórias

Era uma vez uma contação de histórias. As crianças chegavam pela mão ou colo dos pais, olhar atento e curioso. Uma, outra e mais outra até formar um pequeno grupo, heterogéneo, de meninos e meninas, pequenos e graúdos, sossegados e irrequietos. Quando o grupo já estava bem composto, começava a festa. Era uma festa das palavras e dos gestos, e às vezes com a participação de alguns boneco, outros adereços e música. Mas o que nunca podia faltar era o cenário: o reino da imaginação. Cada menino ou menina ia participando com uma ideia do que lhe passava pela cabeça. Juntos, criavam a história. Um dizia que na fazenda estava o canguru, e outro dizia que a vaca estava na floresta. Um dizia que atrás da parede estava um urso, e outro dizia que era um leão. Como peças de um puzzle, cada pedacinho da imaginação de cada um formava uma paisagem com personagens e aventuras. No final, já todos sentados no chão, ouviam uma história da imaginação da senhora ou senhores com quem tinham brincado de faz-de-conta, e tudo acabava em palmas e sorrisos.


É assim por várias livrarias e instituições em São Paulo, principalmente, em mês de férias como este.
Já fomos à FNAC e à Saraiva. Um belo programa para se fazer com crianças.

domingo, 14 de julho de 2013

Coisas que fizeram o Mateus parar



Tatu-bola. No parque a que costumamos ir há uma boa população deles. Na minha terra chamamos-lhe bichinho-de-conta. Curiosamente, eu tinha sensivelmente a mesma idade que o Mateus tem agora quando me encantei por estes bichinhos. "Caçava-os" na escola, e mostrava-os aos meus pais no final do dia. Como podem imaginar, as minhas lembranças da pré-escola não são tão presentes quanto eu gostaria, mas se há coisa de que me lembro é dos bichinhos-de-conta. Todos nós gostávamos de brincar com eles. Tenho outras boas memórias daqueles três anos que ali passei- como é estranho e deixa o coração desencontrado olhar para os prédios que construíram no lugar da nossa escola!.. Havia um cão preso perto do refeitório. Ladrava muito. Nós tínhamos medo, mas não resistíamos a trepar pela cerca e espreitar lá para dentro. Na altura, parecia-nos um ato de coragem...E por falar em refeitório: eu e a Inês ficávamos com mais dois ou três amigos tempos infindáveis até acabar de comer - agora que penso nisso, eu tinha exatamente a idade do Mateus quando conheci alguns dos amigos que mantenho até hoje, e outros tantos que relembro com carinho. Brincávamos num recreio que tinha uns pneus velhos - hoje em dia, não creio que fosse permitido. A minha educadora Maria, por quem tinha adoração e tenho, até hoje, um enorme carinho e amizade- como eu gosto da expressão xi-coração! Quando o senhor fotógrafo ia lá tirar-nos fotografias: à turma toda, sozinhos e com dois amigos que elegíamos. As obras de arte que fazíamos com aquelas tintas a esborratar-nos por completo as mãos. As mini-casas-de-banho. A hora da sesta naquelas caminhas azuis. As histórias que a Maria nos contava, com todos sentados no chão. As brincadeiras com as frutas e legumes de plástico.  As aulas de educação física e de música naquele pequeno ginásio. E quando a Maria casou, ficou um educador connosco por algum tempo. É das coisas que melhor me lembro daqueles anos: um dia em que ele juntou um monte de nós ao redor e disse que ia fazer algo fantástico. Atirou uma corda ao ar, bem alto, o mais alto que conseguiu. Depois, com a voz e a expressão mais entusiasmada que eu já lhe tinha visto, disse-nos: "um pedaço de céu!.. olhem aqui, estão a ver? é um pedaço de nuvem aqui!" Nós não víamos nada, claro, mas todos partilhávamos do entusiasmo dele e enquanto nos acotovelávamos para tentar ver, apontávamos em êxtase: "olha ali!.. olha a nuvem!" Para nós, naquele momento, aquilo era real. A nuvem estava mesmo ali. Conseguíamos vê-la claramente. E, puxa, aquilo era melhor que uma legião de tatus-bola!

quinta-feira, 11 de julho de 2013

Nós e as reclamações

Há tempos que ando para escrever sobre isto, porque foi uma coisa que me impressionou Acho que estou mal habituada porque em Portugal - pelo menos em Lisboa - não são raras as vezes em que pedimos o livro de reclamações e nos acontecem coisas como: "ah, isso não é comigo, é com o fulano" "Tudo bem, então peça ao seu colega, por favor." "Oh sicrano, tu sabes onde está o fulano? Espere aí, é só um segundo." Aguardamos e vem o fulano. "Estamos sem livro. O outro acabou e ainda não foi substituído." Na melhor das hipóteses, dão-nos logo o tal do livro, escrevemos tudo o que nos indigna e, no final, recebemos um mero "ficou registado." Ah, 'tá. Ok. Ótimo. Ainda assim, é bom que façamos a nossa parte, que exerçamos a nossa cidadania. Em Portugal, a única vez que tivemos um retorno positivo foi na - sim, vou dizer a marca - Chicco. O carrinho de passeio do Mateus tinha defeito. Depois de terem tentando corrigir o problema por duas vezes, e de termos falado, escrito email, etc, optaram por o trocar por outro do mesmo modelo. Continuou a dar problemas. Trocaram todo o conjunto trio de carrinho de passeio, alcofa e ovinho por um outro conjunto de outro modelo - diga-se, melhor até do que aquele que tínhamos adquirido e que já tinha saído da linha de produção.
Ora, aqui no Brasil, há cerca de um mês, resolvemos fazer uma reclamação no site da - sim, também vou dizer a marca- Sadia. Escrevemos tudo o que entendemos, da forma mais clara e concreta e, no final...apareceu uma mensagem parecida com "ops, ocorreu um erro, mas fique com esta receita de brinde." Satisfeitos com o ocorrido, fizemos um texto parecido com o que tínhamos acabado de redigir e publicámos num conhecido site de reclamações. Pois, pasmem-se: no dia seguinte recebemos uma chamada do SAC (Serviço de Atendimento ao Cliente) da Sadia. Tinham tomado conhecimento da nossa reclamação, quiseram saber mais detalhes "para que melhorias sejam efetuadas" e deixaram-nos à escolha que produtos gostaríamos que nos fossem levados a casa para ressarcir dos outros em questão. Dia e hora marcados, e nós, confesso, ainda com alguma incredulidade, vemos o motoboy chegar com os ditos produtos. Cinco estrelas! Na reclamação que fizemos no dito site, relatámos de forma elogiosa a ação subsequente da marca, e fizemos questão de ligar ao SAC da Sadia e, da mesma forma, elogiar o trabalho. Porque se é nosso dever reclamar e exigir os nossos direitos, também deve ser elogiar o bom serviço que nos é prestado. Mais uma vez, aqui fica o meu elogio.

quarta-feira, 3 de julho de 2013

Coisas que me fizeram parar







 Flores de...inverno. Com gotas de chuva a deslizar por elas abaixo. Pena que a fotografia não lhes fez jus!..

Eu e o meu filho

Eu e o meu filho nascemos num dia 23: ele de Março e eu de Junho. Nascemos em Lisboa: ele no começo da Primavera, e eu no começo do Verão - em São Paulo ele comemora o aniversário no começo do Outono e eu no começo do Inverno. Ele tem olhos azuis como o avô, e eu esverdeados como a avó. Ele tem o cabelo forte como o pai, e eu fino e liso como a mãe. Ele tem uma marca de nascença na nuca idêntica à do pai, e eu um sinal no peito idêntico ao da mãe. Ele tem a pele bem clara, e eu também. Ele tem o sorriso lindo como o pai. Ele é reguila, ativo e alegre como eu era na idade dele. Ele é esquisito para comer, e eu era mais ainda na idade dele. Ele gosta de dormir com o pé de fora da cama como o pai, mas com os lençóis e cobertores bem arrumadinhos como a mãe - quando a cama está desarrumada ele diz que "está tudo misturado". Eu sou teimosa, e ele teimoso e meio é. Ele tem uma personalidade forte, vincada, e eu uma personalidade fortemente recatada, guardada em mim e de acesso limitado aos demais. Ele adora correr, saltar e fazer "bagunça", e eu mais ainda na idade dele - e confesso, ainda hoje gosto, principalmente com ele. Ele dorme agarrado ao Orelhudo, e eu dormia agarrada à almofadinha que a minha avó me fez.  Ele adora brincar- ele mesmo já me disse que "brincar é a minha coisa favorita"-, e eu adoro brincar com ele. Na verdade, eu também adoro ficar de mera espectadora a vê-lo brincar. (Ele brinca como o meu irmão brincava na idade dele.) Eu adoro enchê-lo de beijinhos e abraços, e ele adora fugir de mim e fazer disso a nossa brincadeira- em pequena eu também dizia "a fábrica de beijinhos já fechou.". Ele adora passear e eu adoro levá-lo a passear. Ele tem sempre as mãos quentinhas como o pai. Tê-lo no colo é o que mais me dá paz, e tê-lo em birra ou num dia não é o que mais me tira do sério! Ele é a minha maior fonte de ânimo e a minha maior exaustão. Ele é a minha maior alegria e a minha maior preocupação.
Ele tem 3 anos e 3 meses, e eu 32 anos. 32 anos...Começo a entrar numa idade em que os anos se sucedem rápido demais e parece nunca chegar o tempo ou a oportunidade para que as coisas se concretizem como sonhámos. Na verdade, os próprios sonhos se vão desvanecendo em meras ilusões disformes daquilo que antes nos pareciam inequívocas imagens de um futuro que estava logo ali à nossa frente, ao nosso alcance. Agora, começamos a passar para o outro lado: aquele em que, quanto mais andamos, mais longe tudo parece ficar. O próprio passado está mais longe. Coisas que recordávamos com clareza, começam a falhar-nos na memória - como o nome da colega de escola, do professor ou o ano em que determinada coisa aconteceu- e aquelas que temos ainda bem presentes, tornam-se valiosas, pequenas relíquias. Relíquias de um presente que talvez não tenhamos valorizado o suficiente mas que, às lentes do passado, ganham uma áurea de carinho. Como o bolo da avó, as brincadeiras de Verão, as peripécias  na escola ou aquele filme que vimos 20 vezes! Aos 32 anos já tive, como todos, algumas perdas - nuns casos foi a morte que me levou, e noutros levou-mas a vida-, e já coleciono um passado considerável. É um passado, em tudo, eclético. Fiz de tudo um pouco, desde cantar num coro infantil, a jogar futebol, estudar Direito, ser ginasta ou pianista. A verdade é que me orgulho de muita coisa que fiz nestes 32 anos, mas o meu pequenote é, de longe, o maior orgulho que tenho na vida! Está certo que ele veio sem eu esperar e que eu não tenho o menor mérito que seja no menino lindo e especial que ele é. Digamos que nos saiu assim na rifa. (Em última análise, e caso se acredite em algo desse teor, talvez algum mérito tenhamos tido para que, no final das contas, nos tenha calhado na rifa). Veio com uma personalidade fortíssima de brinde, temperada com uma notável teimosia. Ainda assim, é um menino carinhoso e a coisa mais adorável desta vida. Ainda assim é, de todas as coisas especiais que fiz na vida, indubitavelmente a mais especial de todas! E de tão especial que é, mantém bem aceso em mim o sonho. Porque apesar dos meus 32 anos me arrastarem para a linha do realismo e, por vezes, - porque não admiti-lo? - do pessimismo, não deixei de ser o que sempre fui: uma sonhadora nata! E se ainda sonho assim, com todas as minhas forças, ele - o meu pequenote de 3 anos e 3 meses - é a principal razão para isso. Ele faz brotar a esperança onde nada parece possível que possa florir. Ele faz tudo valer a pena.  Ele faz-me sorrir só de olhar para ele. Por mais dias, meses ou anos que passem, continuo a olhar para ele e mal acreditar que é meu. Um filho pode não ser o sentido da vida, mas sem dúvida dá um sentido à vida. Ele é o meu norte, a minha estrela-guia. O (que me parece ser) melhor para ele é a minha bússola. É por ele que faço e deixo de fazer tudo. É por ele que luto. E quando eu olho para os seus lindos olhos azuis e o seu sorriso iluminado, como poderia deixar de sonhar? Não. Nem mesmo se quisesse. Ele próprio é sonho feito realidade. E de sonho em sonho, de tanto acreditar, tenho a certeza que vou dar-lhe o melhor futuro, o melhor presente. Ele merece! E eu não posso sequer imaginar que não vá ser dessa forma. Eu não posso deixar de sonhar por ele e para ele. Nem mesmo posso deixar de sonhar os meus próprios sonhos que, verdade seja dita, também têm direito a viver. E, um dia, ele há-de ter orgulho em mim, neles, em cada um que eu perseguir e conquistar. E, um dia, ele vai correr atrás dos sonhos que escolher, e eu estarei ao seu lado, e repetirei incontáveis vezes a mesma frase que já escrevi hoje: ele é o maior orgulho que tenho na vida.