quinta-feira, 7 de abril de 2022

Eu e as percepções da realidade

 Sempre que estou na cozinha a preparar alguma refeição, tenho um fiel companheiro ao meu lado que, paciente e persistentemente, espera (torcendo!) que alguma coisa caia no chão. Qualquer coisa que caia, o meu cachorro quer comer, mesmo que seja um mera casca de cebola! 

Por estes dias, reparei num detalhe do seu comportamento. Ele percebe, pela minha movimentação ou pelo barulho ou não sei por qual meio de percepção seu, quando eu deixo alguma coisa cair, mesmo quando caiu das minhas mãos na bancada ou na mesa e não no chão. Mas a sua reação é sempre olhar para o chão e procurar o que caiu. Inclusivamente, olha para cima, observando o exato lugar onde deixei cair na bancada, depois para o chão,  depois novamente para a bancada, intrigado sem perceber a razão do objeto não estar no chão. Poderíamos apenas dizer que o cão é um idiota por não perceber que as coisas não passam através da bancada até ao chão. Na verdade, o cachorro julga o mundo, os acontecimentos,  de acordo com a sua capacidade de percepção. Não é melhor nem pior do que a nossa. Apenas diferente. E isso fez-me refletir: quantas percepções do mundo nós temos, quantas certezas cultivamos, que não passam de meras expectativas erróneas? Quantas vezes acreditamos que "as coisas vão cair no chão", sem perceber que a nossa visão do mundo é limitada? E quantas vezes ficamos a encarar a "bancada", continuamente à espera que algo caia, sem procurar outra solução, sem questionar? Quantas "leis" regem o nosso mundo que nós simplesmente desconhecemos? Quanto da realidade foge à nossa capacidade de percepção? Impossível não fazer uma analogia com o Matrix. Quando Neo realmente se apercebe do seu poder, começa a ver o Matrix como realmente é: uma teia de códigos e leis que podemos manipular e não um mundo ao qual só podemos reagir ou acomodarmo-nos. O que distingue o meu cachorro de mim na situação da bancada é a ignorância. E a ignorância é o que nos amarra às nossas crenças e limitações. Como sair disso? Ainda citando Matrix, " É a pergunta que nos impulsiona."