sexta-feira, 16 de dezembro de 2022

Eu e a postura invertida sobre os antebraços

 


Nos últimos meses, pratiquei, com regularidade, a postura Pincha Mayurasana (invertida sobre os antebraços). Passados estes meses, senti, finalmente, progressos: consigo montar a postura e sentir-me estável e confortável. A definição de āsana dada por Pantanjali no texto clássico do Yoga "Yogasūtras" é, precisamente, "sthira sukham asanam”, isto é, “a postura deve ser firme e confortável”.

No caminho que percorri com este āsana, além da aprendizagem da postura em si, ficam outras lições que partilho aqui:

1) Não desista de um desafio só porque, no primeiro momento, lhe parece impossível.

No primeiro dia em que tentei montar a postura, senti que era totalmente impossível para o meu corpo chegar àquela posição. Não tinha força nos braços, muito menos no abdomen, por isso, nem de perto, nem de longe, conseguia sequer elevar as pernas, quanto mais permanecer lá em cima. Literalmente pensei "Im-pos-sí-vel!" Mas fui trabalhando, a pouco e pouco, naquilo que me era possível: exercícios preparatórios e, lenta e gradualmente, fui fazendo progressos.

2) Um desafio que nos parece impossível pode ser dividido em pequenas tarefas possíveis.

Por vezes, o desafio que temos pela frente é, realmente, impossível de ser alcançado num primeiro momento. Mas, seja qual for o desafio, podemos dividi-lo em pequenas etapas para o atingir. Ninguém nasce pronto para correr uma maratona, por exemplo. Mas todos podemos começar a correr poucos metros por dia, melhorar a condição física e, quem sabe, atingir as tais dezenas de quilómetros de corrida por dia passado algum tempo e prática. Analise o seu desafio e veja que passos são possíveis HOJE: escrever a primeira linha, fazer os primeiros abdominais, ler as primeiras páginas, cortar um alimento da dieta, juntar uma pequena quantia de dinheiro por dia... Seja o que for: comece pelo que é possível. Há sempre algum passo possível. Dê o primeiro passo.

3) Para conquistar o desafio, conquiste as tarefas possíveis, que podem, na prática, ter poucas semelhanças com o resultado final.

As minhas tarefas possíveis eram exercícios preparatórios e exercícios de fortalecimento. Pouco ou nada se pareciam com a postura e, embora possíveis, nem todas eram fáceis ou mesmo agradáveis...A verdade é que, sem vencer essas etapas, não se conquista o desafio. Ele é construído em cima dessas tarefas não só possíveis mas necessárias, por mais desinteressantes que possam parecer. Apenas conquistamos o desafio se estivermos dispostos a trabalhar, dia a dia, nessas pequenas ações que podem ser exigentes e menos atrativas (como repetir escalas, arpejos e outros exercícios técnicos diariamente no instrumento musical, por exemplo).

4) Para progredir, é preciso ter uma ação persistente e regular.

Não adianta ter um plano, saber tudo sobre a teoria, ver todos os tutoriais e não agir. Qualquer desafio exige de nós uma ação persistente e constante. O progresso não se constrói investindo muito tempo e energia um dia de vez em quando, mas sim, investindo o tempo possível com a máxima regularidade.

5) Sem perder de vista o objetivo final, celebre as pequenas vitórias.

Vencer as tarefas possíveis não só vai estruturando o desafio, dando-lhe forma, materializando-o, mas é também aquilo de que precisamos para ganhar confiança para seguir em frente. Cada tarefa possível, é um passo na direção do nosso objetivo e deve ser celebrado.

6) Todos os desafios envolvem vencer medos.

Sim, pelo meio do caminho há sempre medos a vencer. Também há momentos de desconfiança se, realmente, vamos ser capazes. Só atingimos um desafio se formos capazes de superar cada hesitação no caminho. No caso do meu desafio, é óbvio que eu tinha medo de cair. Se esse medo me paralisasse, eu não teria continuado. Também tive as minhas dúvidas se estaria ao meu alcance conseguir fazer a postura. Ao invés de desistir, eu aceitei que poderia cair algumas vezes, minimizei os riscos fortalecendo-me e praticando no lugar mais seguro possível, e acreditei que, mais cedo ou mais tarde, iria conseguir progressos.

7) Cair e errar são etapas necessárias no caminho.

Sim, caí algumas vezes. Não, nunca me magoei. Mas as quedas que tive, mostraram-me fragilidades, mostraram-me caminhos que tinha de percorrer ainda, mostraram-me erros e ajustes que tinha de corrigir. Os meus erros foram parte do processo para que eu percebesse como acertar. Algumas vezes, faltou-me impulso para chegar à posição de equilíbrio. Outras vezes, tive impulso a mais e não fui capaz de sustentar a postura. Excesso de força, tira-nos do equilíbrio, falta de força não nos tira do mesmo lugar. Entre um e outro erro, encontrei o meu acerto.

8) Conseguir uma vez, não significa ter vencido: os desafios renovam-se.

A sensação de ter conseguido, finalmente, montar a postura, foi muito boa. Uma coisa que me era totalmente impossível no primeiro momento, tornou-se, pelo meu esforço e disciplina, possível. Isso deu-me um sentido de satisfação de ter ultrapassado os meus limites iniciais, de não me ter conformado com eles. O meu corpo respondeu ao desafio, adaptou-se, instruiu-se naquela aprendizagem. Mas depois de conseguir uma vez, demorou um pouco a conseguir uma segunda vez. O desafio continuava: conseguir mais vezes do que aquelas em que errava. E depois de conseguir mais vezes do que as que errava, comecei a conseguir manter-me, finalmente, por mais tempo estável na postura. Então, sim, estável e confortável na postura de equilíbrio, considerei que estava a vencer o desafio. Continuo a desafiar-me: manter-me o maior tempo possível confortável na postura, conseguir montar e desmontar a postura com menos esforço, conseguir transitar dessa postura para outra, ou chegar a ela vinda de uma primeira.

9) A postura é a porta de entrada para o Agora

A coisa que mais me atrai no yoga (e também na música, na ginástica, em todas as atividades que realmente me movem ou moveram na vida) é, além da sua beleza e do facto de eu gostar de conhecer e ultrapassar os limites do meu corpo e mente, o facto de que essas atividades exigem de mim foco total, e isso é a porta de entrada para o Agora, para este único, mágico e irrepetível momento que vivemos a cada segundo. Não há forma de me manter em equilíbrio na postura se o meu foco não estiver totalmente no meu corpo, se a minha mente não estiver totalmente entregue ao que o meu corpo está a fazer. Se os pensamentos se dispersam, se a respiração sai do controle, o corpo desmobiliza-se. E que prazer manter o equilíbrio ali, segura, com observação na respiração e a mente alinhada! Que prazer não sentir qualquer tipo de estímulo exterior ou dispersão interior. Só a respiração, só o Aqui e o Agora. Isso...é yoga.

1 comentário:

  1. Amor da vida, muito orgulho de você, sua dedicação, sua persistência e superação!

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