sexta-feira, 18 de agosto de 2023

159-365

Desde os meus 16/17 anos, sempre gostei de fazer uma mudança ocasional e radical no corte de cabelo. De tempos a tempos, corto-o bem curto. Depois fico anos seguidos com ele longo. Há 14 anos que não fazia essa mudança e, na semana passada, resolvi que estava na hora. Não olho tantas vezes assim para mim própria durante o dia, por isso, só passado mais de uma semana é que comecei a habituar-me ao novo visual. Até então, cada vez que me via ao espelho, ficava surpresa. Não era uma reação negativa, de não gostar do visual, mas apenas de estranheza, de não me reconhecer ali. Os outros - família, conhecidos, alunos - também estranham. Habituamo-nos tanto a determinada imagem que começamos a identificar-nos com ela. E essa é uma das melhores partes de mudar de visual: "despirmo-nos" um pouco de nós mesmos, da imagem que temos e têm de nós e, com isso, abrimos espaços novos. Porque a mudança implica abdicar de uma imagem que tínhamos (ou pensávamos ter) e abraçar uma nova, por mais estranheza que nos cause no começo. A mudança envolve esquecer quem achávamos ser para podermos descobrir quem poderemos ser. A Natureza mostra-nos isso constantemente: a lagarta que abre as asas de borboleta, a cobra que muda de pele, a árvore que se despe para florir novamente, o girino que se transforma em sapo, a semente que rasga a casca para germinar. Nem sempre é tão fácil como cortar o cabelo: às vezes mudar é doloroso, implica coragem, um salto no escuro, um salto de fé. Às vezes caímos, perdemo-nos mas, do outro lado, chegamos mais inteiros, mais nós mesmos, porque a cada vez que ousamos, cai mais uma "casca" que nos enclusurava em quem não somos. Mudar é criar espaço para habitar a própria pele, para ser exatamente quem escolhemos ser.

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