quarta-feira, 3 de julho de 2013

Eu e o meu filho

Eu e o meu filho nascemos num dia 23: ele de Março e eu de Junho. Nascemos em Lisboa: ele no começo da Primavera, e eu no começo do Verão - em São Paulo ele comemora o aniversário no começo do Outono e eu no começo do Inverno. Ele tem olhos azuis como o avô, e eu esverdeados como a avó. Ele tem o cabelo forte como o pai, e eu fino e liso como a mãe. Ele tem uma marca de nascença na nuca idêntica à do pai, e eu um sinal no peito idêntico ao da mãe. Ele tem a pele bem clara, e eu também. Ele tem o sorriso lindo como o pai. Ele é reguila, ativo e alegre como eu era na idade dele. Ele é esquisito para comer, e eu era mais ainda na idade dele. Ele gosta de dormir com o pé de fora da cama como o pai, mas com os lençóis e cobertores bem arrumadinhos como a mãe - quando a cama está desarrumada ele diz que "está tudo misturado". Eu sou teimosa, e ele teimoso e meio é. Ele tem uma personalidade forte, vincada, e eu uma personalidade fortemente recatada, guardada em mim e de acesso limitado aos demais. Ele adora correr, saltar e fazer "bagunça", e eu mais ainda na idade dele - e confesso, ainda hoje gosto, principalmente com ele. Ele dorme agarrado ao Orelhudo, e eu dormia agarrada à almofadinha que a minha avó me fez.  Ele adora brincar- ele mesmo já me disse que "brincar é a minha coisa favorita"-, e eu adoro brincar com ele. Na verdade, eu também adoro ficar de mera espectadora a vê-lo brincar. (Ele brinca como o meu irmão brincava na idade dele.) Eu adoro enchê-lo de beijinhos e abraços, e ele adora fugir de mim e fazer disso a nossa brincadeira- em pequena eu também dizia "a fábrica de beijinhos já fechou.". Ele adora passear e eu adoro levá-lo a passear. Ele tem sempre as mãos quentinhas como o pai. Tê-lo no colo é o que mais me dá paz, e tê-lo em birra ou num dia não é o que mais me tira do sério! Ele é a minha maior fonte de ânimo e a minha maior exaustão. Ele é a minha maior alegria e a minha maior preocupação.
Ele tem 3 anos e 3 meses, e eu 32 anos. 32 anos...Começo a entrar numa idade em que os anos se sucedem rápido demais e parece nunca chegar o tempo ou a oportunidade para que as coisas se concretizem como sonhámos. Na verdade, os próprios sonhos se vão desvanecendo em meras ilusões disformes daquilo que antes nos pareciam inequívocas imagens de um futuro que estava logo ali à nossa frente, ao nosso alcance. Agora, começamos a passar para o outro lado: aquele em que, quanto mais andamos, mais longe tudo parece ficar. O próprio passado está mais longe. Coisas que recordávamos com clareza, começam a falhar-nos na memória - como o nome da colega de escola, do professor ou o ano em que determinada coisa aconteceu- e aquelas que temos ainda bem presentes, tornam-se valiosas, pequenas relíquias. Relíquias de um presente que talvez não tenhamos valorizado o suficiente mas que, às lentes do passado, ganham uma áurea de carinho. Como o bolo da avó, as brincadeiras de Verão, as peripécias  na escola ou aquele filme que vimos 20 vezes! Aos 32 anos já tive, como todos, algumas perdas - nuns casos foi a morte que me levou, e noutros levou-mas a vida-, e já coleciono um passado considerável. É um passado, em tudo, eclético. Fiz de tudo um pouco, desde cantar num coro infantil, a jogar futebol, estudar Direito, ser ginasta ou pianista. A verdade é que me orgulho de muita coisa que fiz nestes 32 anos, mas o meu pequenote é, de longe, o maior orgulho que tenho na vida! Está certo que ele veio sem eu esperar e que eu não tenho o menor mérito que seja no menino lindo e especial que ele é. Digamos que nos saiu assim na rifa. (Em última análise, e caso se acredite em algo desse teor, talvez algum mérito tenhamos tido para que, no final das contas, nos tenha calhado na rifa). Veio com uma personalidade fortíssima de brinde, temperada com uma notável teimosia. Ainda assim, é um menino carinhoso e a coisa mais adorável desta vida. Ainda assim é, de todas as coisas especiais que fiz na vida, indubitavelmente a mais especial de todas! E de tão especial que é, mantém bem aceso em mim o sonho. Porque apesar dos meus 32 anos me arrastarem para a linha do realismo e, por vezes, - porque não admiti-lo? - do pessimismo, não deixei de ser o que sempre fui: uma sonhadora nata! E se ainda sonho assim, com todas as minhas forças, ele - o meu pequenote de 3 anos e 3 meses - é a principal razão para isso. Ele faz brotar a esperança onde nada parece possível que possa florir. Ele faz tudo valer a pena.  Ele faz-me sorrir só de olhar para ele. Por mais dias, meses ou anos que passem, continuo a olhar para ele e mal acreditar que é meu. Um filho pode não ser o sentido da vida, mas sem dúvida dá um sentido à vida. Ele é o meu norte, a minha estrela-guia. O (que me parece ser) melhor para ele é a minha bússola. É por ele que faço e deixo de fazer tudo. É por ele que luto. E quando eu olho para os seus lindos olhos azuis e o seu sorriso iluminado, como poderia deixar de sonhar? Não. Nem mesmo se quisesse. Ele próprio é sonho feito realidade. E de sonho em sonho, de tanto acreditar, tenho a certeza que vou dar-lhe o melhor futuro, o melhor presente. Ele merece! E eu não posso sequer imaginar que não vá ser dessa forma. Eu não posso deixar de sonhar por ele e para ele. Nem mesmo posso deixar de sonhar os meus próprios sonhos que, verdade seja dita, também têm direito a viver. E, um dia, ele há-de ter orgulho em mim, neles, em cada um que eu perseguir e conquistar. E, um dia, ele vai correr atrás dos sonhos que escolher, e eu estarei ao seu lado, e repetirei incontáveis vezes a mesma frase que já escrevi hoje: ele é o maior orgulho que tenho na vida.

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