segunda-feira, 24 de setembro de 2012

As dobragens e eu

Pelo título, um brasileiro que me leia irá julgar que estou a falar de origamis ou algo semelhante. Desenganem-se. Em Portugal, a dublagem designa-se dobragem. Os filmes são dobrados em português. Ou melhor, referindo-me ao que se passa aqui, quem diz filmes diz séries, documentários, entrevistas em programas de variedades ou em telejornais. Tudo. Absolutamente tudo é dobrado. E, se refletirmos bem, a designação é bem mais feliz: o original fica transformado, com a sua unidade e originalidade partidas...Dobradas ao meio, portanto, poder-se-ia dizer. Não gosto. Já me habituei. Felizmente o ser humano é um animal de hábitos! Já não me deixa os nervos em franja e os cabelos em pé. Mas não gosto, nunca gostei e jamais gostarei. Em entrevistas e documentários, embora não aprecie, posso aceitar que o dano não é grande. Em filmes e séries acho perfeitamente inconcebível. É literalmente partir o trabalho do ator ao meio. Só nos desenhos animados é aceitável, uma vez que os desenhos são idealizados sem a voz. É o trabalho do ator que vai dar forma a essa vertente do desenho. Tanto pode ser um grupo de atores americanos, como portugueses, brasileiros ou chineses a realizar esse trabalho de interpretação. Como hoje o nível de detalhe é elevadíssimo, o único senão é o facto de os bonequinhos mexerem os lábios consoante as palavras em inglês: outra dobragem ficará inexata nesse ponto. Ainda assim, não me choca. Apenas chateia um bocadinho, no caso específico do Brasil, ouvir a voz do McQueen na voz do Rango e do Humpty Dumpty - são, frequentemente os mesmos atores (e poucas vezes os "grandes nomes da praça") que fazem esse trabalho. Noutro género de filmes ou séries, é terrível. Ver o Tom Hanks ou o Jack Nicholson ou qualquer outro grande ator ou atriz e ouvir um/a brasileiro/a a falar dá um nó ao meu cérebro e um aperto no meu coração! Não se trata de filmes mudos em que os atores estão a trabalhar a mímica e a expressão, mas sim de filmes em que a voz, a entoação, a forma como cada palavra é dita e cada frase projetada, a respiração...tudo isso faz parte da construção que o ator fez da personagem. Não raras vezes, o ator chega mesmo a adaptar a sua própria voz, o seu sotaque em prol da personagem. Tudo isso tem de ser apreciado pelo espectador como um todo. Eu não quero ver metade da personagem, mas a personagem por inteiro, com todas as características que o ator lhe reconheceu e lhe concedeu através das suas ferramentas. A voz é, reconhecidamente, uma delas.
Um grande bem haja à Tv Cultura. Além de ter uma grade de programação muito interessante, prima por privilegiar a legendagem.

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