quarta-feira, 7 de junho de 2023

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Fiquei vários dias sem treinar a minha abertura de pernas. Nos últimos meses, estava a ter uma boa evolução, mas nas últimas semanas, priorizei outro tipo de treino. Resultado: hoje, ao retomar o treino da abertura, senti que travei, dei alguns passos para trás. Pensei no quanto era natural e confortável para mim fazer isto quando era criança - mesmo que não o treinasse por semanas seguidas. Eu era extremamente flexível. Aliás, isso é uma coisa que eu sempre reparei no meu filho enquanto ele era menor: a sua incrível flexibilidade. As crianças pequenas ficam confortáveis nas posições mais incríveis, todas esparramadas no chão com uma enorme abertura de pernas, com o pé no rosto, costas todas dobradas, de cócoras. O Mateus adorava ficar tempos imensos de cócoras numa posição em que eu não conseguia manter-me dois segundos! Era a sua posição mais natural e de maior conforto. E, da mesma forma que as crianças pequenas têm o corpo extremamente maleável, elas mesmas estão abertas e receptivas ao mundo. Se lhes dizemos para pular para os nossos braços, elas pulam da altura que for, confiantes e alegres. A criança pequena está aberta para conhecer o mundo, quer mergulhar nele, abraçá-lo! A criança pequena não tem bloqueios em relação aos outros: depois de acabar de conhecer outra criança no parque, trata-a imediatamente como amiga. Não tem preconceitos, desconfianças. Acolhe. Quando olha para a outra criança, vê-se a si mesma, entende-a como igual. A criança pequena tem o corpo flexível e a mente igualmente flexível, aberta. Quando crescemos, se deixarmos de trabalhar o corpo, ele enrijece, torna-se enferrujado. O mesmo com a mente: se não a questionamos, se não nos dedicamos a conhecê-la, ela cristaliza-se nas crenças que vamos acumulando de todo o tipo de fonte externa. Quanto menos trabalhamos o corpo, mais ele se fecha, se torna flácido e preso. E quanto menos trabalhamos a mente, mais ela se entorpece em gestos automáticos, inconscientes. A questão é: aquilo em que colocamos a nossa energia, fortalece-se, aquilo em que trabalhamos, desenvolve-se. Tornamo-nos bons naquilo em que mais investimos o nosso tempo. Invista o seu tempo e energia em ser sedentário e cada vez será melhor nessa inércia. Mas, se voltarmos a trabalhar o corpo, ele torna-se mais elástico, flexível, forte. Se continuarmos a trabalhar a mente, nos mantivermos sedentos de aprender e abertos ao que nos rodeia, podemos ter a mesma alegria, ingenuidade e entrega que uma criança tem perante a vida. Já diziam os sábios da Antiguidade clássica "mente sã em corpo são." É o nosso estado natural, é assim que nascemos: abertos, dispostos, flexíveis e com doses inesgotáveis de alegria e curiosidade! E para recuperar, é esse caminho que devemos trilhar: o da abertura,  flexibilidade, curiosidade e disciplina de direcionar a nossa energia para as coisas certas. Abra-se ao mundo. Por mais que as experiências que viveu o tenham feito recolher-se na sua casca. "Em tudo há uma rachadura, e é por aí que a luz entra." (Leonard Cohen) Abra-se à Vida. E quem sabe a Vida pode abrir-se para si também. 

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