Ao aproximarmo-nos para tentar entender o porquê de estar ali, naquela exposição de ilusões de óptica, percebemos que não se tratava de um quadro. Era um espelho! O que era real era o que estava a 45° dele: um desenho com detalhes em alto relevo que retratava os Beatles.
Lembrei-me imediatamente de Platão, Maya (definição presente no hinduísmo e nas escrituras clássicas de yoga) e Matrix. O que os três têm em comum? Platão falava da alegoria da caverna: vivemos em uma caverna na qual apenas vemos o reflexo da realidade na parede à qual estamos acorrentados. Tomamos como reais os reflexos, ecos e sons difusos que nos chegam, mas as coisas reais, com toda a sua luz e exuberância, estão fora da caverna. Maya define também o que poderíamos chamar de ilusão da realidade: o véu que cobre a realidade e nos mantém neste mundo dual (vida/morte, quente/frio, bom/mau) quando a realidade tem uma natureza Una e Eterna, a realidade é o Ser e dele derivam todas as coisas, inclusivé cada um de nós. Matrix, a triologia de enorme sucesso dos anos 90 que ganhou um novo capítulo recentemente, mostra-nos um mundo em que o nosso corpo está aprisionado e a nossa mente projetada num mundo criado pelas máquinas (uma espécie de jogo de realidade virtual). Inconscientes da sua verdadeira natureza, as pessoas vivem nesse mundo desconhecendo que estão a viver uma ilusão mas, quando escolhem tomar a pílula vermelha, acordam para a vida real, fora de Matrix.
Acho fascinante que sabedorias milenares da Antiguidade Clássica e da tradição do yoga e uma saga da cultura pop descrevam, por palavras diferentes, coisas tão idênticas do que é a Realidade.
Tal como a obra de arte que vimos: olhávamos a imagem no espelho, crentes de que era um quadro, quando o quadro real estava construído em baixo, cheio de pormenores, nuances, realces que nos escapavam ao olhá-lo através do espelho.
A beleza da arte é que ela nos convida a olhar para o espelho, mas também através dele, buscando a Realidade que ele reflete, de nós e em nós.
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