sábado, 29 de julho de 2023

150-365

 


Lembro-me da primeira vez em que uma pessoa me disse "vieram-me as lágrimas aos olhos quando te ouvi tocar piano." Lembro-me exatamente de onde foi, quem foi, e do momento em que ela me disse isso, com os olhos marejados, a dar-me os parabéns e a agradecer por lhe ter proporcionado uma experiência especial.
Eu apaixonei-me pela música quando percebi que ela era uma forma de me comunicar, de me conectar primeiro comigo e depois com os outros. E a minha querida professora sempre me disse "se tu te emocionares, os outros também se emocionam". Eu percebi na música essa ponte entre o que eu sinto e expresso e o que os outros recebem e sentem. A música - e a arte, em geral - é uma forma de linguagem mais pura do que as palavras. São emoções que geram emoções. Sem intermediário, sem conceptualização. É uma ponte direta entre quem expressa e quem contempla ou usufrui. Essa é a grande magia da música (e da arte). O mais curioso é que numa sala de espetáculos, em que cem pessoas ouvem a mesma música, os mesmos sons podem ser entendidos e sentidos de cem maneiras diferentes. Cento e uma, incluindo o intérprete. Ainda assim, as cem pessoas vão poder ter aquela rara sensação de pertencimento com que a música nos une. Cem consciências voltadas ao mesmo tempo com plena atenção àquele preciso momento. Cem pessoas envoltas naquele mesmo som e mergulhadas naquele mesmo silêncio. Quando me dizem "chorei ao ouvir-te tocar", sinto que a música cumpriu o seu propósito: algo de mim chegou a quem me ouviu, e quem me ouviu, chegou a algo de si.
Nunca foi sobre aplausos. Sempre foi sobre conexão. Sempre foi sobre partilhar com os outros uma forma de chegar a lugares onde as palavras não nos levam.

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