domingo, 30 de julho de 2023

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Alguns episódios na nossa vida só ganham verdadeiro sentido à posteriori. Steve Jobs falou brilhantemente sobre isso no seu famoso discurso em Stanford https://youtu.be/5BSbOc5VYY8 .
Aos 13/14 anos, eu resolvi abandonar a ginástica artística à qual me tinha dedicado nos 7 ou 8 anos anteriores. Por inúmeras razões e, acima de tudo, por cansaço ou desânimo. Na época, foi uma decisão que me trouxe paz e até alegria: pela primeira vez em muitos anos, tinha tempo de sobra - eu treinava 4 horas por dia de segunda a sábado! - e deixei de ter uma série de restrições na alimentação - "passe livre" nos doces! Essa sensação de liberdade foi, progressivamente, substituída por um vazio, uma falta de metas e sonhos à qual eu não estava habituada. Talvez, no final de contas, não tivesse sido a melhor opção...Passado um tempo, encontrei-me numa encruzilhada no Piano. A minha professora teve uma conversa séria comigo e explicou-me que estávamos a chegar a um ponto sem retorno. Estava muito atrasada no conteúdo para uma prova de final de ciclo e tinha que decidir: ou desistir - e tudo bem, continuávamos amigas - ou arregaçar as mangas e começar a estudar a sério, várias horas por dia. "Desistir"...Aí estava uma palavra à qual eu não pretendia dar espaço outra vez. E o "estudar várias horas por dia", para quem treinava 4 por dia, pareceu perfeitamente aceitável. Resolvi aceitar o desafio, mudámos o repertório e foi nesse momento que, em uma das novas músicas, descobri a poesia da música que me apaixonou.
Entretanto, desde antes de desistir da ginástica, já andava com uma dor forte nas costas. Pensámos que, ao parar o esforço físico da ginástica, essa lesão acabaria por ceder mas o tempo foi passando e a dor ia e vinha, melhorava e piorava, até que começou a só aumentar. Fui ao querido doutor Guimarães, o ortopedista que me tinha tratado na fratura da perna anos antes. Diagnóstico: doença de Scheuermann. "Causada pela ginástica?" "Não, congénita. Mas não poderia ter continuado a praticar, mesmo que quisesse. Vai ter de acompanhar a evolução de X em X meses, fazer fisioterapia e suspender qualquer atividade física por cerca de um ano." E, então, os pontos conectam-se. Eu tive de desistir da ginástica e passar por essa experiência para, depois, não desistir do piano. (E a disciplina da ginástica foi essencial para que eu tivesse disciplina no Piano.) Se eu tivesse saído da ginástica forçada pela minha condição de saúde, acredito que todo o meu percurso tivesse sido outro. "Não podemos conectar os pontos olhando para a frente. Só podemos conectá-los olhando para trás...Tem de confiar em alguma coisa - o seu instinto, destino, vida, karma, o que for - porque acreditar que os pontos se vão conectar em algum momento vai dar-lhe a confiança para seguir o seu coração, mesmo quando isso o tirar do caminho mais conhecido." (Steve Jobs)
Confie no processo. Nada é por acaso. Mesmo quando encontrar um obstáculo no caminho, ou for obrigado a mudar de rumo, ou mesmo quando se sentir perdido, confie no processo. Um dia, tudo fará sentido.

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