quarta-feira, 8 de março de 2023

67-365

 


Estava a estudar piano e dei comigo a pensar: antes de começar a tocar qualquer música, todos nos concentramos alguns segundos. Cada um terá as suas estratégias: podemos ouvir ou cantar interiormente o começo da música, respirar fundo, pensar em algum aspecto específico que exija a nossa atenção naquela obra ou, particularmente, no começo dela. Mas a minha reflexão foi ao que acontece após esses breves momentos: como e de onde surge a decisão de começar a tocar? Talvez pareça descabido, mas reparem. Claro que sou eu que decido colocar as mãos no piano e começar a tocar. Mas por quê naquele exato segundo? O que me impele a isso? Por quê nesse segundo e não no anterior ou no seguinte? Que parte de mim, qual a força interior que me diz "é agora!" (Não que eu pense literalmente essas palavras, mas executo-as, de facto.) E, então  lembrei-me de um documentário fantástico que vi há tempos atrás. "Genius", com o Stephen Hawking. Em um dos episódios, falou-se da questão do livre-arbítrio, e foi realizada uma experiência (idealizada, anos antes, pelo psicólogo Benjamin Libet). Os participantes tinham a sua atividade elétrica cerebral acompanhada enquanto tinham uma tarefa simples para cumprir: apertar um botão quando quisessem enquanto olhavam para um relógio projetado na torre que estava à frente deles. O ponteiro do relógio girava, girava e, quando lhes apetecia, carregavam no botão e surgiam fogos de artifício. No final da experiência, observando a atividade cerebral, concluiu-se que a atividade elétrica começa a subir em direção ao pico (o momento em que o botão é apertado) cerca de 2 segundos antes. Isso significa que, meio segundo antes de realmente iniciar a atividade motora de mexer o dedo (pico), o cérebro já está envolvido na decisão propriamente dita. Ou seja, há uma parte do nosso inconsciente que, um segundo antes, inicia a atividade cerebral que precede e determina a escolha consciente. Comecei a pensar como era quando fazia ginástica artística: em qual momento eu decidia que ia correr para o salto de cavalo, ou começar nas paralelas ou, mais delicado ainda, realizar algum movimento na trave? Há os momentos de concentração imprescindíveis (tal como antes de tocar piano), mas há, indubitavelmente, uma espécie de força interna que nos move na direção daquele desafio num momento específico. Alguma coisa em nós já sabe quando é a hora certa. E essa certeza antecede qualquer pensamento que seja. Então, quanto das nossas decisões conscientes é determinado pelo nosso inconsciente? A este respeito, diga-se que temos, por dia cerca de 70000 pensamentos, e desses milhares de pensamentos, cerca de 90% são idênticos aos do dia anterior, correm de forma automática, ou seja, inconsciente. Isto significa que, em cerca de 90% do nosso dia, estamos a operar de forma inconsciente. E, nesta dança de consciente e inconsciente, vamos equilibrando e exercendo a nossa Vontade.

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