segunda-feira, 13 de fevereiro de 2023

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Hoje dei por mim a pensar na minha avó, como fiz tantas vezes nos últimos anos. Já faz quantos anos que a perdemos? 18 anos? As perdas são duras. Nós temos medo da perda. Sofremos por antecipação das perdas que tememos sofrer. Mas, já dizia Mário Quintana, "só o que está perdido é nosso para sempre." Dei por mim a pensar se realmente perdi a minha avó? O mundo, sim. Perdeu a sua presença. Mas em mim, a luz e a alegria dela vivem. Enquanto eu viver, ela vive em mim. Até a presença dela eu sinto. Ouço as suas palavras em mim. Não só as que me disse, um dia, mas as que intuo me diria hoje. Quanto das nossas perdas está realmente perdido para nós? Quanto das nossas perdas se torna ausência? Quando sofremos uma perda, o que nos deixa de facto? A presença física, o abraço, a gargalhada juntos, as vivências deixam de ser possíveis, mas nada do que vivemos e sentimos nos deixa. Tudo isso, é nosso para sempre. O elo não se perde. O amor não nos deixa.
Sabe aquelas bolachas enfeitadas, trabalhadas, tão lindas que até dão pena de comer? Aquela roupa deslumbrante que guardamos para ocasiões especiais? O dinheiro guardado para aquela viagem? Se não comermos a bolacha, apodrece, se não usarmos a roupa, deixa de servir ou perde a cor, aquela viagem pode nunca acontecer. Comer a bolacha, usar a roupa ou gastar o dinheiro significa que os perdemos? De certa forma, sim, mas o facto de fazermos deles experiências nossas, torna-os nossos para sempre. A perda faz parte da vida. É inevitável. Mas deixar de viver alguma coisa por medo da perda, não nos apegarmos a alguém por medo da dor, é inútil. Nós estamos aqui para viver, plenamente. Não nos apegamos às pessoas, mas ao que vivemos com elas. Não nos apegamos às relações, mas ao que elas nos fizeram sentir. E experiências e sentimentos, nunca ninguém nos tira. Todas as coisas têm um propósito, e o nosso propósito é, acima de tudo, viver e amar. Passar pela vida a tentar poupar-se das perdas, é contrariar a nossa natureza, que é amar. Não se apegue à dor. Sinta-a pelo tempo que for necessário, viva-a e, quando estiver pronto, solte-a e celebre o que a vivência deixou em si de bom, de aprendizagem ou crescimento. A verdade é que sofremos mais pelo que não nos permitimos viver do que por aquilo que vivemos e nos magoou. Tudo o que experenciamos e amamos nunca estará perdido. Vive em nós, é parte de nós. É por isso que, enquanto eu viver, a minha avó vive. E a dor de a ter perdido não é nada comparada com o tamanho do amor que tenho por ela e a gratidão e privilégio que sinto por ter convivido com ela. Cada vez que a recordo, e que escrevo sobre ela, sinto que a eternizo, da forma que ela merece. 

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