domingo, 26 de fevereiro de 2023

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Quando eu conecto os pontos das coisas que moveram a minha vida até agora, é muito claro que uma das coisas que tive de aprender a cultivar foi a disciplina. Enquanto pratiquei ginástica artística, a disciplina era essencial: eram 4 horas de treino em 6 dias da semana (com poucas semanas de férias) e, em cada treino, eram repetições e repetições dos mesmos exercícios. A treinadora, às vezes, até brincava connosco "É para fazer N vezes! O que é N? Indeterminado..." E era assim mesmo. Quantas vezes tínhamos de repetir um exercício até o conseguirmos executar sozinhas e bem? N vezes. Depois da ginástica, comecei a dedicar-me mais ao estudo de piano. Eram igualmente horas de estudo, 7 dias na semana, com repetições e repetições dos exercícios e músicas. Quantas vezes temos de repetir algumas passagens das músicas até as conseguirmos executar bem? N vezes.
Com total naturalidade deparei-me com o facto de "disciplina" ser um dos pilares do yoga. "E aquela (repetição), praticada com dedicação e cuidado, sem interrupção e por longo tempo, é a base firme." (Glória Arieira) Este conceito (abhyasa), aplica-se não apenas à prática das posturas (āsanas), mas também, e principalmente, ao conhecimento da nossa verdadeira natureza, que é o objetivo do yoga. Para entendermos quem somos e porque somos como somos, temos que ter uma atenção constante aos nossos hábitos e escolhas. Caso contrário, seremos escravos de automatismos que se instauraram com o tempo: os mesmos gatilhos, geram as mesmas reações, que geram as mesmas emoções, que são sensíveis aos mesmos gatilhos. Para podermos libertar-nos dessas "flutuações da mente" que nos impedem de perceber a nossa verdadeira essência, é preciso atenção plena, constante. Só assim poderemos ter escolhas conscientes. Só assim poderemos tornar-nos conscientes de nós mesmos. Em quanto tempo? Quantas vezes? N vezes. O que não me assusta nem desanima, porque, pela minha experiência, por mais antagónico que possa parecer, percebi que a disciplina não nos aprisiona: liberta-nos. É ela que abre as nossas asas e nos permite voar. Sem disciplina, não saímos do chão. (E eu sempre gostei de voar.)

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