sábado, 18 de fevereiro de 2023

49-365

 



Nos últimos anos tenho-me aproximado cada vez mais de uma estética mais minimalista na música. Arvo Pärt, por exemplo, é um compositor que, desde os tempos da faculdade, me emociona de uma forma muito especial. A simplicidade das linhas melódicas, a forma como as ressonâncias se propagam, como o silêncio é chamado a intervir na música. Somos levados para uma atmosfera quase celestial. Divina. Nas suas palavras: "Descobri que é suficiente quando uma única nota é tocada de forma bela." Não que um Beethoven não me emocione, um magistral Bach, Mahler ou Wagner. Claro que toda a complexa malha de emoções que ali encontramos, mexe comigo. Mas, de alguma forma, na simplicidade dos minimalistas, a minha alma repousa, suspira, sente-se em casa. Talvez porque partilho o que Arvo Pärt revelou sentir como "Uma necessidade de me concentrar em cada som, de forma a que cada folha de relva seja tão importante como uma flor." Arvo Pärt diz que o canto gregoriano lhe ensinou "que um segredo cósmico se oculta na arte de unir duas ou três notas.” Eu sinto que esse segredo está lá, na música dele, e é partilhado com quem a ouve. "Tive de me livrar de tudo o que era desnecessário...para me salvar a mim próprio", diz Arvo Pärt. Conta-se que, ao ser questionado sobre como tinha conseguido esculpir Davi de forma tão bela, Michelangelo respondeu "Eu não tive de me preocupar em esculpir Davi naquele bloco de mármore, mas em retirar daquele bloco de mármore tudo o que não era Davi e, então, Davi revelou-se plenamente."Para mim, é isso que Arvo Pärt consegue na sua música: deixa que ela se revele naquilo que realmente é e, ao mesmo tempo, nós, ouvintes, sentimos que ela nos revela que é em menos que mais nos encontramos.

Sem comentários:

Enviar um comentário